É preciso estar atento para que o nosso pensamento não contribua para o projeto colonial de mistificar os povos ciganos. O etnocentrismo ultrapassa seu conceito e etimologia (campo de estudo da origem das palavras), de uma pessoa que considera superior sua própria cultura e atua de
forma supremacista. Não, o mundo não está dividido entre supremacistas e povos que foram racializados, afinal, a colonialidade também atua nos detalhes. É assim que ela se mantém até hoje.
Qualquer pessoa de etnia, seja indígena, cigana ou quilombola, já deve ter ouvido em sua vida, alguém geralmente desconhecido, lhe perguntar se conhecemos sua avó que seria de alguma comunidade étnico-racial. Por que pessoas de etnia são continuamente convocadas a falar por todo seu povo? Isso é um recorte do etnocentrismo da socialização de pessoas criadas fora de critérios étnicos-raciais, pois não vemos ninguém fazendo a pergunta a um alemão, se ele também conhece a árvore genealógica de toda a Alemanha. Já chegaram a nos perguntar, no espaço desse coletivo, se conhecíamos uma avó desconhecida pega no laço. Os corpos sagrados de mulheres ciganas, assim como de outros povos, são hiperssexualidados e vistos como alvo fácil. Cruel é o mundo que romantiza e naturaliza a expressão da avó de determinada etnia que foi caçada.
É comum a procura por parentes que o próprio desconhece, sem nome ou foto. Casos de abandono parental, coisas das quais estão longe da percepção e controle de outros ciganos e organizações. Afinal, nossa tradição é familiar e oral, existem apagamentos, mas o que sua família não sabe, dificilmente alguém saberá. Nossa coletividade também é composta por individualidades.
Existem, em dados não oficiais, mais de meio milhão de ciganos no Brasil. Seria humanamente impossível conhecer cada cigano neste território.
É bom conhecer e estudar termos como descendência, pertencimento e ancestralidade, temos dito.
O IBGE não faz o censo de nosso povo, mas somos constantemente convidados a fazer o mapeamento por nós mesmos. Além de frustrante, está fadado ao erro.
Que façamos nossas retomadas de maneira a também sair dessas ciladas coloniais inspiremos no que povos tradicionais têm a revelar sobre outro tipo de vida a ser vivida. Uma que não seja colonizadora com a tradição de nós, povos tradicionais.
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